terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Cisne Negro - Análise Crítica



Análise feita para a matéria Psicanálise II juntamente com minha imbatível dupla, Bruna.


Perfeição. Eis a palavra crucial ao se tratar do filme Cisne Negro.

A jovem bailarina Nina anseia para ser perfeita e para atingir esse objetivo é necessário que ela seja escolhida para representar o papel principal na peça “O lago dos cisnes.” Pura contradição.

Nina é o verdadeiro cisne branco. A garota – que já é mulher – vive com a mãe, que também era bailaria e deixou a dança após ter ficado grávida da filha.

Durante o filme é claro a situação de que a mãe de Nina quer que a filha seja a bailarina que ela não pode ser tornando-se assim extremamente controladora em relação à vida da garota. Nina, por sua vez, faz do sonho da mãe seu próprio sonho e dedica-se a carreira de bailaria com extremo fervor.

Nina vive da e para a dança. Como já dito, seu objetivo é ser perfeita. No entanto, toda sua dedicação acaba por prejudicar-lhe quando a chance de ser a protagonista na peça em que sempre sonhou aparece.

O problema se dá porque, para encenar o cisne negro, é preciso sensualidade, certo toque de malícia que Nina criada como uma garota que deve ser uma excelente e delicada bailarina, não possui. O modo como foi criada, a forte ligação com a mãe, a influência que sua mãe tem sobre ela, principalmente sobre a sua psique e pode-se até arriscar em dizer que sua mãe parecia ser uma parte externa da inconsciência de Nina, que freqüentemente alimentava o masoquismo e o narcisismo da filha, de forma doce até, mantendo a garota aprisionada em valores até mesmo infantis. O simbolismo desse aprisionamento é bastante explícito no filme, sua inocência, ingenuidade e até a própria infantilidade do seu quarto. A bailarina é completamente pura e inocente.

Segundo Freud (1914 – p.82), a libido afastada do mundo externo é dirigida para o ego e assim dá margem a uma atitude que pode ser denominada como narcisismo. Desse modo, podemos entender que é isso que ocorre com Nina. Seus instintos são dirigidos para a ânsia em atingir a perfeição.

No momento em que a bailarina nota que não está sendo perfeita, cai em desespero. Ela deposita seus instintos coçando seu corpo com tamanho nervosismo que passa a se machucar, a criar feridas na pele. Nas palavras de Freud (1914 – p.90): a hipocondria, da mesma forma que a doença orgânica, manifesta-se em sensações corpóreas aflitivas e penosas, tendo sobre a distribuição da libido o mesmo efeito que a doença orgânica.

É preciso que Nina desenvolva seus instintos sexuais para conseguir o papel que tanto anseia e quem acaba por lhe ajudar nisso é diretor, Thomas Leroy da companhia de ballet. Thomas estava disposto a ir fundo nas entranhas de Nina e arrancar a parte obscura e totalmente desenfreada da garota. Thomas quer Nina como a gêmea má também, como o Cisne Negro que é o oposto do Cisne Branco e principalmente o oposto de Nina, e sua primeira lição para ela é ir pra casa e conhecer-se, sentir-se, o que lhe entrega de bandeja o primeiro contato com a sexualidade, com a masturbação. O diretor quer uma bailarina de sexualidade aflorada, de agressividade competitiva, alguém que realmente passe a emoção e os sentimentos do papel, o que leva a dançarina agora a um doloroso conflito interno. Ele provoca a garota para aflorar seu lado negro e ela se sente atraída por isso, porém ao mesmo tempo transpassa resistência e sentimento de culpa quanto a isso.

Será correto fazer uma ligação sobre essa relação de Nina com o diretor da companhia juntamente com a teoria do Complexo de Édipo de Freud? Durante o filme o pai da moça não é ao menos mencionado, o que nos faz compreender que ela não obtém uma figura paterna e o diretor, um homem mais velho, lhe desperta interesse ao mesmo tempo em que se sente culpada.

Essas situações como de desejo seguido de culpa é extremamente analógica com os papéis que Nina deseja encenar, o de cisne negro e o de cisne branco. É como se ela, tendo os dois dentro de si, não tivesse ousadia o suficiente para deixar isso transcender.

Voltando a falar da relação de Nina com sua mãe, ainda de acordo com Freud:

“O amor dos pais, tão comovedor e no fundo tão infantil, nada mais é senão o narcisismo dos pais renascido, o qual, transformado em amor objetal, inequivocamente revela sua natureza anterior.” (1914 – p.98)

Frustrada por sua carreira, a mãe da bailarina quer que a menina seja tudo o que ela não foi. Controlando arduamente a vida da filha que acaba por não desenvolver uma personalidade própria. A cobrança de sua mãe é tão grande que em determinado momento do filme Nina, completamente sufocada, passa a sentir raiva disso. Rebela-se.

Mais que o trágico final dessa história, a parte de grande impacto é quando Nina enfrenta a mãe e sai com sua colega também bailarina Lilly, embebeda-se retorna para casa embriagada.

O que gera curiosidade é a cena após essa chegada, em que Nina se tranca em seu quarto com Lilly e as duas supostamente transam. Sim, supostamente, pois não fica claro se aquilo realmente aconteceu ou foi uma projeção causada pelos instintos reprimidos de Nina.

Lilly era a bailarina perfeita para interpretar o papel do cisne negro, que Nina tinha tanta dificuldade em fazê-lo. Isso gera um sentimento de inveja juntamente com admiração de Nina para com a amiga – novamente o cisne negro e o branco se mostram na personagem. É possível que esse conflito de sentimentos tenha feito com que Nina depositasse em sua concorrente toda a sua libido, mesmo que só em imaginação.

Os impulsos instituais libidinais sofrem (...) repressão patogênica se entram em conflito com as idéias culturais e éticas do individuo. Nesse fragmento de Freud (1914 – p.100) podemos compreender melhor os desejos de Nina para com Lilly.

Por fim, Nina consegue deixar com que seu lado negro aflore e faz sua tão sonhada apresentação. Vivenciar seu lado negro juntamente com seu lado branco não foi possível para a ilustre bailarina. Ela não conseguiu dominar os dois lados, seu ego não foi possível de suportar tal interpretação. Aliás, é certo dizer que o cisne negro seria o Id de Nina? Então, com sua morte, foi ele quem venceu?

O filme mostra de modo tão forte o conceito de narcisismo que nos deixa até apreensivos para falar sobre o assunto, com medo de não saber expor de maneira clara nossos pensamentos – tão simples – com os conceitos – tão complexos – de Freud.

Como dito no começo do texto, perfeição seria a palavra crucial ao se tratar dessa história. O narcisismo de Nina se faz presente em todo tempo por essa busca para ser perfeita, mesmo quando encontra a morte que então, finalmente se satisfaz tendo como últimas palavras “Eu fui perfeita!”


Referências:

ü FREUD, S. Sobre o narcisismo: uma introdução (1914). In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud. Vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

FREUD, S.O Ego e o Id. (1923). In: Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud. Vol. XIX. Rio de Janeiro: Imago, 1996.


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